Há mais de
10 anos conheço uma jovem que, vez ou outra, passa por certas dificuldades, as
quais acontecem com ela desde criança. São crises de ausência, transe
prolongado, força física exacerbada, saídas conscientes do corpo, percepções
extrasensoriais, etc., sendo tudo isto reputado a um prolongado e difícil
problema obsessivo. Tratamentos desobsessivos foram tentados ao longo do tempo
com poucos resultados positivos.
Não faz
muito tempo, ao ler Magnetismo Espiritual de Michaellus, a “ficha foi caindo” a
cada capítulo. Descobri que esta irmã é sonâmbula.
Ficou claro
para mim, naquele momento, o porquê do desdobramento consciente, da
insensibilidade física, da dupla vista. Aquilo que sempre foi tido à conta de
obsessão, nada mais é do que sonambulismo natural que, mal orientado, tem
provocado distúrbios diversos na vida dela e dos que lhe rodeiam. Como foi
possível ninguém ter percebido esta ligação?
Inclusive
eu, nunca tinha pensado nesta possibilidade até a leitura do livro, o que me
causa uma certa vergonha.
Afinal de
contas, Kardec deixou um capítulo inteiro (e extenso) escrito em O Livro dos
Espíritos sobre os fenômenos anímicos intitulado “Emancipação da Alma”.
Nas demais
obras da Codificação existem muitas referências ao assunto, tanto quanto na
Revista Espírita nos seus diversos volumes.
E eu que já
li e reli O Livro dos Espíritos inúmeras vezes!
Será que
estamos sabendo estudar Kardec? De outra forma: será que estamos dando o devido
valor às obras do codificador? Quantos espíritas será que existem que fazem
confusão entre os fenômenos anímicos e os fenômenos mediúnicos e que todo tipo
de dificuldade enfrentada, remete à influência dos Espíritos? Conhecer então a
importância do sonambulismo para o Espiritismo... nem pensar. Para ilustrar,
transcrevo abaixo o e-mail que uma amiga espírita me enviou.
Trabalho em um Centro Espírita onde estudamos a
polaridade como uma técnica de passe (se é que assim posso dizer). Estudamos um
livro de Richard Gordon "A cura pelas mãos". Daí comecei a sentir dores
pelo corpo no momento de aplicação.
Curiosamente eu senti uma dor na perna esquerda
em um paciente e, quando ele voltou, oito dias depois, mancava e sentia dor na
mesma perna (lá nós não comentamos nada com os pacientes, às vezes sutilmente
percebemos ou o mesmo fala); depois comecei a ver manchas escuras que passeiam pelo
corpo; certa feita vi minha mão entrar no corpo e voltar com algo redondo e
escuro e tinha a sensação que segurava algo. Quando toco nos pacientes, às
vezes é como se suas células conversassem comigo e me dissessem de “algo” fisico
ou psíquico. Recentemente, vejo por dentro do corpo humano como um ultrassom de
última geração em 3D e colorido. Não são em todos os pacientes, varia muito.
Vejo médicos, cirurgias e, por vezes, com auxílio de irmãos espirituais alivio
dores. Em outros momentos aumento estas dores. Até agora fiquei quieta, achei
que o telefone só toca de lá prá cá. Mas, como vem aumentando os detalhes, acho
que devo aprender e auxiliar os “amigos”. Só não sei como, às vezes fico na
dúvida do que sinto e vejo e nada falo aos amigos médiuns que me cercam. Antes que
você pense, não tenho formação na área de saúde. Depois disso tudo, leio e,
quando vejo os orgãos, recorro aos mapas de anatomia e fico pasma, são iguais.
O que devo fazer? Você pode me ajudar? As pessoas que converso aqui me dizem
que estou em desenvolvimento mediúnico, faz oito anos, que tudo isso acontece.
Já esperei demais sem me aprofundar, sei que os amigos espirituais precisam de
instrumentos afinados. Agradeço mais uma vez.
Muita paz.
Dá para
imaginar o drama desta irmã, possuindo inúmeras faculdades valiosas que podem e
devem ser utilizadas para beneficiar o próximo, porém, sem conhecimentos
adequados por parte dela e das pessoas com as quais convive nas atividades do
Centro Espírita.
Aquilo que
se tem entendido como mediunidade, pode-se ver que é fenômeno anímico, ou seja,
faculdades da própria alma encarnada, como por exemplo, percepções e sensações
com relação às desarmonias do paciente, visão interna dos órgãos físicos, dupla
vista. Ao que parece, existe uma capacidade mediúnica, porém complementada por
uma bela faculdade anímica. São, portanto, recursos medianímicos que necessitam
de estudo por parte da sua portadora e de todos os envolvidos, a fim de se
encontrar formas adequadas de aproveitá-los para o benefício do próximo.
Muitas
Casas Espíritas não contemplam estes assuntos em seus estudos doutrinários.
Além do mais, as pessoas não podem comentar o que sentem e, quando comentam,
recebem respostas ou explicações evasivas e superficiais. Os pacientes também
não podem relatar o que sentem a fim de se fazer um acompanhamento eficiente
das suas problemáticas. E quanto se aprenderia com estes relatos! Sendo assim, é
preciso adequar as estruturas de trabalho pois, do contrário, pode-se
simplesmente desperdiçar estas oportunidades por não se saber lidar com elas ou
por força de uma estrutura que não condiz com os instrumentos humanos e
psíquicos disponíveis.
Inúmeras
“Casas” não oferecem condições nos seus trabalhos de cura para que se possa
acompanhar a situação do paciente ao longo do tratamento, nem estabelecem
trocas de experiência entre os trabalhadores, onde facilmente se detectaria as ansiedades
e angústias de pessoas como a autora do e-mail acima.
Não é à toa
que o magnetismo e o sonambulismo são tão desconhecidos por nós espíritas, o
que realça a nossa ignorância. Logicamente, não estou generalizando pois há
inúmeros companheiros que se dedicam ao aprendizado teórico e prático destes
fenômenos que formam a base do Espiritismo. É do conhecimento de todos,
acredito, que toda mediunidade tem seu pilar de sustentação nos fenômenos de
emancipação da alma.
Evolutivamente,
a faculdade mediúnica surgiu a partir do momento em que o espírito encarnado
desenvolveu a capacidade de dissociar-se do corpo físico iniciando, cada vez de
forma mais direta, os contatos com os seres de outras dimensões que, aos
poucos, procederam ao processo de transmissão mental através do indivíduo em
transe, vindo, com o tempo, a surgirem as mais variadas nuances mediúnicas tão
bem estudadas por Allan Kardec e que compõem as suas obras.
Os
fenômenos anímicos se revestem da maior importância para a ciência magnética no
ponto em que esta engloba desde a telepatia e a visão à distância, passando
pela dupla vista, catalepsia e letargia até chegar ao êxtase, dentre outros.
Todas estas variações da emancipação da alma já eram conhecidas dos
magnetizadores antigos, inclusive de Kardec, mesmo antes do surgimento da Doutrina
Espírita.
Através do sonambulismo,
por exemplo, os magnetizadores detectaram a existência do Espírito como
princípio imortal no ser humano.
O
sonâmbulo, que a maioria das pessoas só conhece como sendo alguém que acorda no
meio da noite e caminha pela casa (sonambulismo natural), era utilizado
largamente pelos magnetizadores durante os tratamentos, quando a faculdade se manifestava
espontaneamente no paciente, como meio de diagnóstico e orientação quanto ao
método de cura. Estes indivíduos que conseguiam realizar as maiores proezas psíquicas
como enxergar o interior do seu corpo físico e detectar as doenças, ver através
das paredes ou de qualquer corpo opaco, ler com os olhos vendados, captar
pensamentos, ver à distância, tornar-se insensíveis à dor, etc., provavam, através
destas faculdades, que existe algo no ser humano que não pode ser físico pois
que transcende a todas as possibilidades de realização dos sentidos físicos.
E saber que
Kardec estudou tudo isto e colocou na Codificação Espírita. Pena que nos grupos
de estudo, nas palestras, seminários, congressos, etc. este tema é tão pouco
abordado. Não é que dou menor valor à mediunidade, em hipótese alguma, mas é
que nós encarnados somos também Espíritos. E todas as faculdades que aqui
relatamos, e ainda outras, fazem parte da herança espiritual que carregamos.
Somos dotados destas capacidades em menor ou maior grau por que somos
Espíritos. E muita gente as possui sem se dar conta, muitas vezes confundindo
com mediunidade ou mesmo com obsessão.
A única
saída é repensarmos a nossa maneira de estudar e aprender Kardec. Deixar de
lado o “fulano disse que é assim” ou “o Espírito tal disse que é assim” e voltarmos
a usar a lógica que Kardec sempre utilizou. E em matéria de lógica Kardec é exemplar.
Alguns fenômenos anímicos definidos por Kardec:
SONO: momento de repouso do corpo quando o Espírito,
aproveitando que os laços que o ligam ao corpo afrouxam-se e não precisando
este último da sua presença, se lança no espaço e entra em relação mais direta
com os outros Espíritos.
SONHO: é a lembrança do que o Espírito viu durante o
sono. Nem sempre sonhamos por que nem sempre nos lembramos do que vimos ou de
tudo que vimos. Devido a não termos a alma em pleno desenvolvimento das
faculdades, não nos resta mais do que a lembrança da perturbação que acompanha
a partida ou o regresso ao corpo, à qual se junta a lembrança do que fizemos ou
do que nos preocupa no estado de vigília.
TELEPATIA: comunicação de pensamento com outros
Espíritos, encarnados ou desencarnados, mesmo em vigília, embora o faça mais dificilmente.
LETARGIA: perda momentânea da sensibilidade e do
movimento. A suspensão das forças vitais se dá de forma geral dando ao corpo
todas as aparências da morte.
CATALEPSIA: semelhante à letargia, só que de forma
localizada, podendo afetar uma parte mais ou menos extensa do corpo e deixando
a inteligência livre para se manifestar.
SONAMBULISMO: estado de independência da alma em que esta se
encontra na posse plena de si mesma. Pode ser natural ou magnético (provocado)
e ocorre principalmente durante o sono. O sonâmbulo pode adquirir a
clarividência com a qual pode ver à distância, através de corpos opacos, ou
ainda demonstrar conhecimentos que não expressa no estado de vigília. Pode
também conversar com Espíritos e deles receber orientações.
ÊXTASE: estado em que a alma se encontra mais
independente ainda do que no sonambulismo. A alma do extático penetra nos
Mundos Superiores, vê os Espíritos que lá habitam e compreende a sua felicidade.
DUPLA VISTA: é a vista da alma, embora o corpo não esteja adormecido.
Dá a quem a possui a faculdade de ver, ouvir e sentir além dos limites do
nossos sentidos. Percebem as coisas ausentes por toda parte onde a alma possa
estender a sua ação; veem, por assim dizer, através da vista ordinária e como
por uma espécie de miragem.
Extraído de O Livro dos Espíritos, cap.
Emancipação da Alma.
Um comentário:
Está matéria está no Jornal Vortice ANO II, n.º 04, de setembro/2009, mas não é assinada, eu transfiro então os créditos ao relator do jornal, sr. Adison Mota.
Postar um comentário