DO PERIGO
DE MAGNETIZAR, MESMO UMA ÚNICA VEZ, SEM INSTRUÇÃO PRELIMINAR (CAPÍTULO XIII)
TRADUÇÃO DE
LIZARBE GOMES
Depois das
explicações precedentes, torna-se mais fácil compreender que é perigoso
magnetizar sem conhecer as consequências do ato que se vai fazer. A maior parte
das pessoas que num excesso de bondade, de zelo ou de curiosidade tenta magnetizar,
mesmo uma única vez, não tem nenhuma ideia do mal que possam fazer e dos arrependimentos
que preparam para toda vida.
Elas
evitariam fazer isso antes de ter um conhecimento exato dos efeitos magnéticos.
Uma só sessão de magnetização pode, com efeito, comprometer a vida de um homem.
“Um perigo
que é nulo nos incômodos leves e recentes, diz Deleuze, é maior nas doenças
orgânicas e antigas. Pode-se fazer mal ao se magnetizar uma única vez com
energia para dissipar uma dor interior produzida por um abscesso, por um humor
que. há vários anos, se conduz, em certas épocas, sobre um órgão. Quando
perturbamos um movimento que estava estabelecido ou que se excita um movimento
contrário, é preciso regularizá-lo para que ele não traga nenhuma desordem.
Os
acidentes que aconteceram porque se interrompeu bruscamente um tratamento
começado não devem ser atribuídos ao magnetismo, mas à imprudência do
magnetizador.” (Inst. Prat,. 283)
Quando há
sonambulismo, os perigos são mais surpreendentes e também mais terríveis.
De início o
contato ou toque de certos corpos leva às vezes a convulsões horríveis que
colocam a vida do doente em perigo, eis um exemplo já antigo:
“Eu peguei
um garrafa, disse Lehogais a Puységur, para dele me servir da maneira como
Catarina (uma sonâmbula) me indicava. A Srta. Rousseau sofria ainda mais, mas
não entrava em crise. Catarina se admirou: É singular – disse ela – quero tocar
eu mesma esta garrafa”.
Eu a deixei
fazer e examinava com atenção o efeito que isso produzia sobre a Srta.
Rousseau; mas qual foi minha surpresa de ver, instantaneamente, Catarina cair
em convulsões horríveis! Ajudado por minha esposa e por minha filha, eu não
podia contê-la. Esta jovem, naturalmente de caráter dócil, cujas crises eram
comumente tão calmas, se debatia com uma força surpreendente e entrava em
crises assustadoras. Eu custei muito a acalmá-la e, bastante assustado pelo
efeito que eu lhe havia causado, prometi a mim mesmo não mais tocá-la. À noite
ela se foi mais tranquila, suportou tudo melhor do que de costume sem mesmo se ressentir
de nenhuma fadiga do estado em que ficou.
Eu esperava
que, não a tocando mais, ela não teria mais crise, mas no dia seguinte, na
mesma hora, Catherine teve as mesmas convulsões da véspera! Mais uma vez foi
difícil fazê-la retornar.
Enfim,
durante quatro dias este estado se repetiu.
“O senhor
avalia qual era o meu estado de inquietude e o quanto eu me reprovava por ter
me servido de um meio o qual conhecia apenas imperfeitamente.”
Sim, sem
dúvida, respondeu Puységur, o único perigo que há no uso do magnetismo é
servir-se dele sem conhecer seus recursos; sua indiscrição pode ter
desorganizado esta jovem pelo resto de seus dias.” (1)
Nas três
obras que precedem esta, eu tive ocasião da falar da irreparável infelicidade
que aconteceu a um jovem médico cheio de talento, de sinceridade e de boas
intenções. Estando convencido da realidade do magnetismo, este jovem não quis
se dar ao trabalho de abrir os livros que tratam da matéria. Que se pode
aprender, dizia-se naquela época, nos escritos de homens que não são médicos?
Na primeira
vez que ele magnetizou para provocar sonambulismo – pois ele nunca ouviu nada
sobre medicina magnética – ele teve êxito; mas, apenas adormecida, sua doente
lhe disse, vendo o estado em que se encontrava, que ela seria em tal época atacada
por tal doença, que ela morreria tal dia e a tal hora! Espantado, sem ter
nenhuma prática, apenas alguns conhecimentos de fatos semelhantes, o
magnetizador improvisado se contentou em despertar sua sonâmbula, que morreu
como ela havia anunciado.
Eis um
outro fato que prova como é perigoso, com as melhores intenções, impor as mãos
sobre um doente sem ter nenhuma idéia das consequências da magnetização.
Há um mês,
um padre muito estimado e sábio físico me encaminhou uma senhora cuja filha de
dezoito anos sofria da tísica; ele disse às duas que elas podiam confiar em
mim.
A mãe, que
conhecia o magnetismo apenas por ter visto fazer passes em sonâmbulas, anunciou
sua determinação ao confessor: ela foi vê-lo com sua filha:
- Mas meu
pai – lhe disse a senhora – eu vi magnetizar; em seguida a doente se torna sonâmbula;
se o senhor quisesse magnetizar minha filha, nós saberíamos em que nos deter em
sua doença.
O confessor
se recusou, dizendo que, apesar de seu desejo de ser útil, ele nada entendia de
magnetismo.
Mas a mãe,
insistindo bastante e acreditando que só os homens podem magnetizar,
mostrou-lhe a maneira de passar a mão diante do rosto. O padre pareceu surpreso
que tal maravilha pudesse resultar de uma ação tão simples. A mãe da doente lhe
suplicou ainda para tentar, afirmando que ela conhecia o Sr. Aubin Gauthier
apenas de reputação ao passo que ela tinha nele, como homem e como confessor,
uma ilimitada confiança.
Convencido,
o padre elevou uma mão trêmula, desceu-a, depois recomeçou e continuou durante alguns
minutos. Com efeito, a jovem adormeceu e o padre, depois de contemplar por um instante
este espetáculo novo para ele, disse a doente:
- Você se
tornou sonâmbula, minha filha?
- Sim, meu
pai!
- Você
poderá então nos dizer por si mesma o que pensa de sua doença?
- Meu
estado é horrível!! É tarde demais, eu não escaparei!!
Com esta notícia
arrasadora, a mãe entrou em desespero; o padre, desolado por ter servido de instrumento
pelo qual se chegou a semelhante resultado, se apressou em destruir a ligação magnética
e despertou a doente que não mais pode se tornar sonâmbula novamente.
Provocou-se
assim, nesta jovem, uma crise útil para a qual a natureza estava preparada, e
se a doente devia estar sonâmbula apenas por uma única vez, era preciso ao
menos aproveitar para lhe dar o tempo de melhor ver o seu estado e indicar a si
mesma os remédios convenientes.
Um homem
que é verdadeiramente magnetizador se conduz de outra forma; ele sabe que um sonâmbulo,
na primeira inspeção de seu interior, algumas vezes se assusta com o progresso
de sua doença e com o estado em que ele se encontra. É por isso que ele lhe
inspira a calma que o ajuda a apreciar sua posição e indicar os remédios que podem
salvá-lo, testemunha Puységur.
(...)
Os fatos
provam, evidentemente, ser necessário, em magnetismo, ter conhecimentos
especiais e, acima de tudo, muita calma. Para prová-lo, citarei ainda Deleuze:
“Há
sonâmbulos que experimentam repugnância em examinar seu mal; eles se assustam
ao ver a desordem interior em seus órgãos. Neste caso, você não partilhará os temores
de seu sonâmbulo; você empregará o poder de sua vontade para determiná-lo a
trazer o mais escrupuloso exame de sua doença, a considerar sem medo o interior
de seu corpo, como se este corpo lhe fosse estranho e a fazer esforços para descobrir
os meios de cura.
Se você
tiver calma, se você sabe querer, seu sonâmbulo lhe obedecerá certamente; ele
se tranquilizará e lhe explicará o perigo presente e os meios de remediá-lo.
Talvez você não consiga curá-lo, mas você procurará todo o alívio possível e você
saberá o que deve lhe esperar.
Não perca a
esperança, mesmo quando lhe afirmarem que sua doença é incurável; seguidamente
tenho visto sonâmbulos dizerem, nas primeiras sessões que seria impossível de arrancá-los
da morte e, em seguida, encontrar-se a maneira de recuperá-los.” (Inst. Prát.,
121 e 122)
(...)
AUBIN
GAUTHIER
(1)
Puységur, Memórias, 38 – Felizmente a natureza veio em socorro da doente;
depois de fortes dores e de uma febre terçã que durou um mês, sua saúde
retornou.
Jornal Vórtice ANO III, n.º 06,
novembro/2010
Um comentário:
Bom dia Irmao Daniel, gostei muito desta materia como de tantas outras que voce tem postado, continue este seu trabalho, pois tem sido de muita ajuda para min
Grande abraço Edeseo Brasil
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